segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Get me away from here I'm dying

Ela abriu os olhos. Era noite e um frio incompreensível a fez despertar de um sono não muito confortável.
Era segunda ou terça-feira de um janeiro insuportavelmente quente e úmido. Percebeu o som do aparelho de ar-condicionado, foi recobrando os sentidos e se viu semi-nua, jogada em uma cama ainda fechada. A fraca memória dos últimos momentos de lucidez começava a trazer algum sentido àquela cena corriqueira que por alguns instantes pareceu tão absurda.
Lembrou da súbita vontade de entrega que a fez desabar sobre o edredon sem que nem mesmo se desse ao trabalho de completar o ritual da pasta de dente e pijamas. Qualquer tipo de movimentação parecia demasiadamente agressiva mas, precisava tomar uma atitude, sentia frio, muito frio.

Sentou-se com os olhos ainda semi-cerrados, olhou para o pequeno abajour florido em cima do criado mudo. Não acenderia a luz de forma alguma, era mais do que poderia suportar naquele momento.
Continuou a lenta análise sobre o quarto bagunçado, iluminado apenas por uma luz distante vinda da cobertura do prédio em frente e das poucas estrelas naquele céu de cidade grande - Essa noite nascera sem lua. Como são tristes as noites que nascem sem lua. - Olhou na direção da janela e um pouco mais embaixo, sobre o cesto de roupas limpas estava ela, a camisa que tinha emprestado a ele algumas noites antes para que carinhosamente substituísse a sua, encharcada pelo temporal que assolara a cidade naquela outra noite, de sexta ou sábado. Naquele dia ela quis protegê-lo. Foi o dia em que soube que era o fim. Depois daquilo não se veriam de novo, não mais, pelo menos não daquela forma.

Pensou em vestir a camisa, não por qualquer pedaço de saudades ou sentimento romântico, pelo contrário, apenas por ser o objeto que acabaria com todo aquele frio com menos esforço. Pegou o pedaço de pano nas mãos e sentiu uma paralisação repulsiva. Não queria se proteger com a camisa que agora pertencia a ele. Ela não o queria e menos ainda nada próximo da idéia de algo que fosse deles.
Ficou parada tentando entender como o cheiro ainda impresso no tecido, aquele mesmo cheiro que até tão pouco tempo despertava uma espécie de sensação de aconchego, um carinho diferente, sem fronteiras nem cobranças poderia ter se transformado em algo simplesmente enjoativo. O cheiro era o mesmo. Mas, já não podia reconhecê-lo.
Lembrou de quando mais cedo, ainda durante o dia daquela segunda ou terça de janeiro, um homem atravessou o seu caminho vestindo o mesmo perfume e da maneira curiosa como ela, em um impulso, virou a cabeça e fechou as narinas enojada pela possibilidade de ser invadida por qualquer tipo de lembrança e seguiu.

Agora estava acordada, bem acordada. Foi até a janela da sala fumar um cigarro e ouvir a noite. A rua parecia excessivamente parada. Nenhum som, nem carros nem vento. Estava quente ali fora e isso era um alívio. Pensou muito pouco. Queria ficar alí sentindo esvaziar-se. Sabia que surpreendentemente não choraria ou ficaria triste. Era o fim. E ela alí parada e vazia, contradizendo uma de suas músicas favoritas.

E foi escovar os dentes para voltar, dessa vez sob as cobertas, para a melancolia de um sono inimaginavelmente calmo.

domingo, fevereiro 07, 2010

Estátuas

Se em algum lugar onde você não está,
te procuro e te acho.
Você acha justo?
Você acha fácil?
Ainda é você quem quero na densidade das horas passadas ao lado do estranho,
que agora é meu,
e é você,
sem ser seu,
porque é.