quarta-feira, novembro 24, 2010

Desabafo

Preciso interromper a sequência de devaneios e quebrar pela primeira vez a “quarta parede” que protege o que escrevo nesse espaço para fazer um desabafo.

Hoje acordei com um frio na espinha e um aperto no peito, não tinha nenhum motivo específico para me sentir assim, mas admito que casou muito bem com a sensação que tive ao levantar e ler as notícias na tela do computador.

A violência que assola a cidade do Rio de Janeiro não é nenhuma novidade. Convivo com sua presença e constante crescimento desde o dia em que nasci. Só que hoje bateu diferente. Não sei se porque dessa vez a violência chegou a porta da minha casa, por ter tido um amigo morto estupidamente ainda esse ano, ou, simplesmente, por estar mais velha e menos inconsequente. Sei que hoje as explosões, os assassinatos, os tiroteios, o desrespeito, a irresponsabilidade e o descaso me fizeram chorar.

Não tenho conhecimento político e sociológico suficiente para tentar desvendar de quem é a culpa e muito menos quais seriam tecnicamente as possibilidades reais de ação para enfrentarmos esse triste quadro. Sei, como todo carioca apaixonado pela cidade que sente o peito encher de alegria e canta mentalmente o samba do avião todas as vezes que está a poucos minutos de chegar ao Galeão, que apesar da beleza do pôr do sol no Arpoador, da delícia do café da manhã no Parque Lage e da descontração dos amigos no baixo Gávea, era claro que, mais cedo ou mais tarde, entre momentos de tempestade e calmaria, a bomba iria explodir, essa panela de pressão já está apitando há muitos anos. Faz tempo que os avisos estão pregados nas nossas caras e muito pouco foi feito, pois a violência e a miséria se escondiam no incrível e distante mundo das favelas e da baixada. Só que agora a violência “desceu o morro” e bateu na porta da classe média e dos ricos. Nossa situação atual, como já declarou nosso governador, Sérgio Cabral, é de guerra. Uma guerra que talvez pudesse ter sido evitada, talvez não. Mas que daqui pra frente dificilmente será ignorada.

E quanto a isso, por mais cruel que possa soar, não fico exatamente triste. Já era hora que toda essa sujeira explodisse para fora dos armários para que fossemos obrigados a encará-la de frente e aprender a lidar com a bagunça e com a nossa parcela de responsabilidade. É claro que a polícia carioca é uma das mais criminosas do mundo, que nossos políticos são ladrões e corruptos e que todo o sistema de governo está em acelerado processo de decadência. Mas, nada disso invalida a grande parcela de responsabilidade da sociedade civil, que ao contrário do que se ouve por aí, vai muito além do voto.

Quando falamos da nossa sociedade, da nossa cidade estamos falando das nossas vidas. Não existe bem estar pessoal sem o bem estar do grupo. Vivemos em sociedade, tudo o que fazemos em nosso único e exclusivo benefício, na maioria das vezes, prejudica o todo, logo, nos prejudica.

Enquanto estamos preocupados em consumir, em aparentar, em cuidar das nossas vidas, dos nossos apartamentos, carros e viagens pessoas estão sendo assassinadas na portas das suas casas, morrendo em filas de hospitais e crescendo sem nenhum tipo de perspectiva.

Talvez tenha chegado a hora de começarmos a repensar os nossos valores, nossos desejos. Não protegemos nossas crianças matriculando-as em escolas particulares e escondendo-as atrás das grades dos condomínios, assim estamos apenas evitando que elas tenham contato com uma realidade que já bate à porta.

O carro do ano e as roupas mais caras não nos libertam de sermos brasileiros, logo, pobres e ignorantes. Pertencemos a um todo que tem 16 milhões de analfabetos, e isso não mudará ao alfabetizarmos os nossos filhos e só.

De pouco adianta se cercar de cultura e riqueza dentro da sua própria casa se do lado de fora reina a violência e a miséria. Lembra das aulas de matemática do primário? Quando um grupo está contido no outro à ele pertence. E nossos pequenos e confortáveis oásis nadam no lamaçal da miséria.

Estamos tão preocupados com a manutenção dos nossos empregos, dos nossos hábitos, dos nossos desejos que esquecemos de pensar no sentido que tudo isso está trazendo para as nossas vidas.

Fomos cegados por uma sociedade que nos incentiva a consumir desenfreadamente, mesmo não tendo recursos para suprir esse consumo. E exatamente para o bem de quem? Tudo o que acreditamos precisar nos traz realmente felicidade? Ou foi o que nos foi dito que deveríamos querer para então alcançar a tal felicidade?

Acredito na total liberdade de ação, cada indivíduo deve empregar sua atenção e seu dinheiro naquilo que achar conveniente. Não tenho a ingenuidade de acreditar em movimentos socialistas em pleno ano de 2010. E mesmo se quisesse, a realista formação que me foi dada por uma mãe ex-presa política, que hoje é uma bem sucedida jornalista assalariada, não me permitiria. Mas, o olhar para o coletivo e o questionamento sobre os desejos de consumo propostos pelos movimentos podem muito bem serem levados em consideração. Assim com a responsabilidade individual em relação ao todo. Não podemos reclamar da violência se não tomamos nenhuma atitude concreta para combatê-la.

Já está mais do que na hora de pararmos de culpar fatores externos pela confusão que está se tornando a nossa sociedade e começarmos a encontrar dentro de nós as armas para combater aquilo que tanto desprezamos e cobramos que seja combatido por outros. O problema é de cada um de nós e só será sanado quando houver uma tomada geral de responsabilidade. De uma forma ou de outra, nós também estamos puxando esse gatilho.

quarta-feira, novembro 10, 2010

Devaneios sobre neblina ou O dia que não acordei.

2.

Quando Manuela saiu da cama Felipe já estava de banho tomado, o cheiro de sabonete misturado ao do perfume do namorado causavam uma sensação agradável apesar de exagerada. “Bom dia, princesa. Preciso sair rápido para ver um apartamento que irá a leilão na quarta feira, pode ser um bom investimento, você me espera para o almoço?”- Foi o que ele disse enquanto abotoava a camisa de manga comprida de algodão branco que fazia com que parecesse ainda mais altivo e cheio de frescor. Ela sorriu com suavidade e disse que sim enquanto se acostumava com a claridade. Você pode aproveitar para levar o Gondry para passear, ou se preferir, vamos juntos quando eu voltar. Ele disse isso lhe dando um beijo carinhoso e saindo pela porta. Ela acenou que sim e mais uma vez sorriu.


Michel Gondry, oito meses, Bulldog francês de olhos expressivos e esbugalhados, todo branco com uma única mancha perfeitamente redonda e preta perto da cauda, gostava de dormir abraçado a uma galinha de borracha e de roer os pés da mesa de jantar.


Era tudo dela. O apartamento cuidadosamente decorado, o homem bonito e amável, o simpático cachorro... Como poderia então se sentir tão à deriva, tão sozinha e pertencente a coisa ou lugar nenhum? Para que algo te pertença não é necessário que você pertença a esse algo também? Não queria fazer julgamentos sobre si. Sabia que aos olhos dos outros e, talvez, até aos seus próprios, pareceria uma menina mimada, sentada no alto do seu castelo encantado sem conseguir achar graça em nenhum dos milhares de presentes que ganhava todos os dias. Talvez fosse mesmo apenas uma pirraça, uma rebeldia sem causa para colorir o mundo enfadonho que a cercava, que passaria assim que encontrasse uma novidade que enchesse seus olhos, mas a verdade, é que de qualquer maneira, essa novidade não aparecia e aquela vontade de nada convertera-se em pequenas explosões que agora a devoravam por dentro deixando nenhuma escapatória que não o movimento.


Em dois tempos tirou a camiseta listrada azul e branca, adorava essa combinação, e a calcinha de renda pérola e enfiou-se no chuveiro frio. Detestava banho frio, mas teve a sensação de que um pouco de desconforto seria bom para acordar os sentidos e obedeceu. A pressão da água gelada sobre as costas e cabeça faziam com que Manuela se sentisse em uma cachoeira, mas precisamente na cachoeira dos primatas, no horto florestal, perto da casa onde passara sua infância. Conseguia sentir o perfume tenro da terra molhada, da água limpa e de jaca partida que eram tão característicos. E a excitação, o medo alegre dos sagüis que tinham como brincadeira favorita atirar sementes e coco nas pessoas que invadiam sua mata. Se perdeu em seus pensamentos até sentir arder a pele já avermelhada pela baixa temperatura da água. Desistiu de xampus e condicionadores. Se enrolou na tolha branca e felpuda e sentou na cama ainda molhada, com pingos escorrendo dos agora ainda mais longos cabelos castanhos enquanto tentava controlar as pernas, braços e queixo que não paravam de tremer. Por uns instantes perdera-se na infância, nos sentimentos daquela que é pelo que foi e voltando a si, abandonou-se sob o edredom macio ainda embrulhada na fria toalha molhada.


...Continua.



quarta-feira, setembro 08, 2010

Devaneios sobre a neblina ou O dia que não acordei.

1.

Uma vontade imensurável de algo que não se sabe. Angústia? Não. Apatia? Não. Ansiedade? Também não. Algo mais concreto, uma necessidade física, quase palpável, um anseio por liberdade, mas não daquele tipo comum, nada relacionado a espaços ou pessoas. Um desejo pelo despojamento total de tudo o que se pensa e, principalmente, do que se sente.

Manuela acordara assim. Com uma vontade imensa sem corpo ou nome, que engolia tudo, destituindo de sentido até os gestos mais cotidianos como levantar da cama ou beber um copo de suco de laranja. Não é que lhe faltasse força, pelo contrário, disposição era o que não faltava, mas já não conseguia encontrar razão para ser ou querer. Provavelmente era algo grave, as coisas não deveriam simplesmente perder o sentido assim, de uma hora para outra. Não era coerente, mas de qualquer forma, quando não se vê mais sentido o que primeiro se perde é a coerência.

Manu, 26 anos, cabelos castanhos, olhos azuis vibrantes, fotógrafa e jornalista por formação, por hora desempregada, adora perfume de limão na comida, mas não tem total consciência disso, prefere dias nublados e sente muita saudade da mãe.

Fez as contas, fazia exatos dois anos, três meses e vinte e oito dias desde que ela e Felipe decidiram morar juntos . Levavam uma vida feliz, bastante feliz. Gostavam das mesmas músicas, riam das centenas de piadas particulares que criaram ao longo dos útlimos anos e falavam, como falavam, se pareciam e eram grandes companheiros, todos notavam.

Felipe, , 29 anos, moreno, cabelos lisos e curtos, barba sempre por fazer, arquiteto, uma paixão infantil por cavalos e lego, há dois anos procura o lustre perfeito para iluminar a mesa de jantar na sala, botafoguense.

Era feriado, sete de setembro, dia da independência do Brasil, um dia engraçado, quase uma piada, isso já seria motivo para uma boa conversa matinal, falariam sobre o país, sobre as sequelas da nossa mambembe colonização, sobre o projeto de alfabetização social onde Manu era voluntária durante a faculdade, sobre a época que Felipe morara na Suíça e as maravilhas de se viver em uma sociedade civilizada, emendariam nos questionamentos sobre a falta de noção de limite da sua geração, beberiam café da nova máquina de café expresso que ganharam de presente de Ricardo, pai de Felipe, e terminariam jogados na sala enquanto ele leria a coluna de esportes e ela organizaria a coleção de CDs cultivada desde a pré adolescência.

Ricardo, 63 anos, cabelos cacheados e grisalhos precisando de corte, barba muito bem feita, predileção por camisas azuis, matemático pós doutorado, morador convicto de Santa Tereza, apaixonado por Carlos Gardel e pelas estrelas.

Mas, naquele dia não. Aquela conversa já não faria sentido, nem o café, nem os CDs e menos ainda Felipe. Diante daquela vontade imensa de algo que não se sabia, mas que a tudo se sobrepunha, tudo o que existira até então parecia pequeno, indigno de atenção diante da grandiosidade dos não acontecimentos.

... Continua.

segunda-feira, agosto 02, 2010

Um silêncio enorme.

Onze dias, ela tinha contado. Onze dias desde que envelhecera um pouco de vida.

Passado o choque, ela se viu ali, parada, olhando de fora a dor que lhe roubara pedaços dos sonhos. Não de sonhos concretos, desses dos quais se quer alguma coisa. Mas, daqueles que nos fazem seguir, andar olhando pra frente, sem pestanejar.

Era o final de um domingo bonito, agradável. Esses dias ensolarados de inverno no Rio de janeiro, onde o sol é carinhoso, a brisa suave e as cores e sombras fazem a fotografia do filme mais bem cuidado parecer brincadeira de estudante.

Mas, algo parecia fora do lugar: O dissipar da tristeza. Um movimento natural e ao mesmo tempo incoerente. A vida que seguia a enchia de uma melancolia doce, de uma certeza de que crescer tinha mais a ver com encontrar fé no improvável do que com aprender a caminhar.

Não existia a menor possibilidade de se acostumar com a dureza dos fatos, com a certeza de que apesar da grandiosidade dos acontecimentos, o mundo não pararia. Tudo seguiria igual. Os carros, os faróis de trânsito, as crianças nas escolas, as conversas nos bares, as fábricas, os sons, as cores... Tudo seguiria igual, naquele mundo diferente.

Ela queria saber palavras que dessem sentido a todo esse circo de carne, ar e concreto. Mas, as palavras, não vinham.

As imagens, lindas, que a cercavam por todos os lados, pareciam nada além de uma grande folha de papel em branco. Imagens vazias de sentido, mas repletas de sentimento, inundadas pela vida que corre, vivida.

Ilusão partida da vida que segue.

terça-feira, maio 04, 2010

Desculpe a incoerência.

Ela não sabia onde estavam seus pés, pernas ou braços.

Seu corpo já não era mais nada além de uma imensa massa de ar seco, que estufava suas veias e roubava-lhe a vida.

Tinha esquecido de si, dos seus porquês, de sua força.

Não sentia mais fome, sede, pavor, só sobrava o nada.

E a imagem daqueles olhos... Que lançavam todo o frio, a raiva e a dor que a matavam aos poucos, mutilando seus sonhos como o pior dos carrascos de um feio filme medieval.

Até aqui, ela sabia-se forte, e agora, não era nada. Nada além daquele monte de ar e galhos tortos e secos.

O inverno chegara mais cedo do que o anunciado. Sufocando o perfume do outono, de suas damas da noite, trazendo só a umidade viscosa da terra molhada.

No lugar da esperança da brisa macia e das cores suaves fez-se a maior das nevascas.

E agora ela está alí, imóvel, imersa no frio, nas cinzas de um mundo de água salgada.

segunda-feira, abril 26, 2010

O avesso do avesso

Hoje sonhei que virava um rio.
Foi um sonho acordado, daqueles mais claros que toda lucidez possível.
De quando sonhamos o que somos quando vazamos tudo o que fomos um dia.


Hoje sonhei que era um rio.
E minha água não eram clara nem turva, nem fria ou quente.
Mas, macia... e doce. Como um corpo sem lágrimas.


Hoje sonhei que era rio.
Um rio sem margem. Seguindo o infinito sem ser nunca tocada.


Hoje, sonhei acordada. Sonhei ser um rio, sonhei que era nada.

terça-feira, abril 13, 2010

A raiz quadrada de 37

Eles pareciam saídos de um filme inglês do final dos anos 90, mas era apenas uma noite qualquer no Pão de Açúcar da rua jardim botânico. Se esbarraram no corredor de bebidas. Ela procurava café, ele qualquer coisa mais forte. Ela, a cada passo, colocava algo que não precisava na cestinha de plástico azul, sem lembrar que teria que carregar toda aquela tralha ladeira acima, ele não conseguia escolher.


Ele sabia que ela tinha um gato, pela areia, e era um pouco antiquada, pelas botas de cowboy. Ela viu que ele era fã dos Ramones, estava escrito na camiseta.


Ela amava o outono, Ele queria desaparecer.


Eles nunca tinham se visto antes e nem se veriam depois, ou, em caso contrário, não se lembrariam. Mas, naquele momento estavam ali, as únicas duas pessoas fazendo compras em um supermercado situado a 22º 54' e 23'' de latitude sul e 43º 10' e 21'' de longitude oeste , às 22:49 de uma segunda-feira de Abril, e isso já era o suficiente.


Ela estava se apaixonando por alguém que acabara de chegar, ele estava se dilacerando por alguém que acabara de partir. Ela ouvia "Closing time" e andava como em um videoclipe adolescente, ele não sabia o que fazer com as mãos.



Se encontraram na saída dos caixas, ela levando muitas sacolas com produtos desconexos, ele uma garrafa de Coca e um pacote de Trakinas sabor morango.



Ele queria saber qual era a música que ela colocava para tocar de novo e de novo, ela não parava de trocar as sacolas de braço. Ele se arrependeu por não ter trocado de roupa, ela balançava a cabeça ao som dos fones de ouvido. Ele tentava se aproximar a cada passo para oferecer ajuda com as sacolas, ela cantava a música baixinho. Ele começou a gostar do jeito que ela pisava os calcanhares com mais força do que o resto dos pés e quis andar atrás dela para sempre, ela sentiu o cheiro de dama da noite e apertou os olhos.



Ele daria o mundo para não precisar voltar para casa, Ela estava cansada.



Ele olhou para ela, ela olhou para ele. Ele abaixou a cabeça, ela sorriu.


segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Get me away from here I'm dying

Ela abriu os olhos. Era noite e um frio incompreensível a fez despertar de um sono não muito confortável.
Era segunda ou terça-feira de um janeiro insuportavelmente quente e úmido. Percebeu o som do aparelho de ar-condicionado, foi recobrando os sentidos e se viu semi-nua, jogada em uma cama ainda fechada. A fraca memória dos últimos momentos de lucidez começava a trazer algum sentido àquela cena corriqueira que por alguns instantes pareceu tão absurda.
Lembrou da súbita vontade de entrega que a fez desabar sobre o edredon sem que nem mesmo se desse ao trabalho de completar o ritual da pasta de dente e pijamas. Qualquer tipo de movimentação parecia demasiadamente agressiva mas, precisava tomar uma atitude, sentia frio, muito frio.

Sentou-se com os olhos ainda semi-cerrados, olhou para o pequeno abajour florido em cima do criado mudo. Não acenderia a luz de forma alguma, era mais do que poderia suportar naquele momento.
Continuou a lenta análise sobre o quarto bagunçado, iluminado apenas por uma luz distante vinda da cobertura do prédio em frente e das poucas estrelas naquele céu de cidade grande - Essa noite nascera sem lua. Como são tristes as noites que nascem sem lua. - Olhou na direção da janela e um pouco mais embaixo, sobre o cesto de roupas limpas estava ela, a camisa que tinha emprestado a ele algumas noites antes para que carinhosamente substituísse a sua, encharcada pelo temporal que assolara a cidade naquela outra noite, de sexta ou sábado. Naquele dia ela quis protegê-lo. Foi o dia em que soube que era o fim. Depois daquilo não se veriam de novo, não mais, pelo menos não daquela forma.

Pensou em vestir a camisa, não por qualquer pedaço de saudades ou sentimento romântico, pelo contrário, apenas por ser o objeto que acabaria com todo aquele frio com menos esforço. Pegou o pedaço de pano nas mãos e sentiu uma paralisação repulsiva. Não queria se proteger com a camisa que agora pertencia a ele. Ela não o queria e menos ainda nada próximo da idéia de algo que fosse deles.
Ficou parada tentando entender como o cheiro ainda impresso no tecido, aquele mesmo cheiro que até tão pouco tempo despertava uma espécie de sensação de aconchego, um carinho diferente, sem fronteiras nem cobranças poderia ter se transformado em algo simplesmente enjoativo. O cheiro era o mesmo. Mas, já não podia reconhecê-lo.
Lembrou de quando mais cedo, ainda durante o dia daquela segunda ou terça de janeiro, um homem atravessou o seu caminho vestindo o mesmo perfume e da maneira curiosa como ela, em um impulso, virou a cabeça e fechou as narinas enojada pela possibilidade de ser invadida por qualquer tipo de lembrança e seguiu.

Agora estava acordada, bem acordada. Foi até a janela da sala fumar um cigarro e ouvir a noite. A rua parecia excessivamente parada. Nenhum som, nem carros nem vento. Estava quente ali fora e isso era um alívio. Pensou muito pouco. Queria ficar alí sentindo esvaziar-se. Sabia que surpreendentemente não choraria ou ficaria triste. Era o fim. E ela alí parada e vazia, contradizendo uma de suas músicas favoritas.

E foi escovar os dentes para voltar, dessa vez sob as cobertas, para a melancolia de um sono inimaginavelmente calmo.

domingo, fevereiro 07, 2010

Estátuas

Se em algum lugar onde você não está,
te procuro e te acho.
Você acha justo?
Você acha fácil?
Ainda é você quem quero na densidade das horas passadas ao lado do estranho,
que agora é meu,
e é você,
sem ser seu,
porque é.

sábado, janeiro 16, 2010

A Lá Twitter

Não posso me cobrar qualquer tipo de direcionamento racional e coerente vivendo em um mundo onde os gêneros musicais se subdividem em tipos como: Indie-Rock, Synth-Pop, Synth-Pop-Rock, Emotronic, Power-Pop, Power-Pop-Rock...

E contrassenso se escreve com dois "esses".


Virou bagunça!
Vou entregar ao multi-mega-cosmos.